UMA DÉCADA DE MOTOCICLISMO

Revisado em: 03/03/2018 | Categoria:
Diário de Motocicleta

Dos meus 13, quando aprendi a pilotar, foram mais 21 anos sonhando em ter uma moto, que por conta da vida que se seguia, nunca tive condições de tê-la.

Então só me restava nas rodas de amigos, sonhar uma velhice de cabelos brancos, rasgando estradas retas encima de uma Harley, sem a menor ideia de destino, e fundamentado apenas por imagens de cinema.

Eu carreguei durante muito tempo uma suposta impressão de liberdade, bobinha e inocente, mas na certeza que ela viria encima de uma moto.

E quando as chaves do apartamento estavam no bolso, o carro estacionado na garagem e a minha filha na escola, a expectativa de família constituída e estável deu espaço para a realidade avessa de um casamento partido, e neste cenário de caos, a rebeldia de uma adolescência punk me fez juntar os trocados e comprar minha primeira moto – uma Yamaha Virago 250cc 1.997.

Neste 8 de Agosto de 2016 eu completo uma década de motociclismo, e me lembro como se fosse ontem, do medo de quem não pilotava há mais de 12 anos, o momento em que encarei meus primeiros 70 km rumo ao litoral para um final de semana cheio de dores no corpo na praia.

A expectativa da liberdade me tocou com fortes dores musculares, e do alto de um prédio, eu via a moto na garagem e lamentava o fato de ter que voltar para casa montado nela.

Não era pra doer tanto, e a esperança que aquela dor cessasse, latejou por mais tempo, pois minha filha mudou-se para o interior do interior, me colocando no caminho 700 km de asfalto até seus beijinhos.

E a expectativa de dor se desmoronou diante da felicidade do seu sorriso, e a realidade de ter seus abraços, por vezes, esmagaram o meu coração na volta para casa.

Só Deus sabe o quanto eu já chorei dentro de um capacete, e só Ele sabe o quanto agradeço tanta dor, por que a única coisa que forja um motociclista é a estrada, o vento e o amor.

E foi na superação das dificuldades, da dor física, da moto que não ligava, das distâncias percorridas... e da necessidade de ver minha pequena a cada 20 dias que forjou os alicerces de quem sou hoje.

Como sempre digo, bicho gente não foi feito pra viver sozinho, e por sorte encontrei o amor na forma de Elda, e com ela na garupa da Viraguinho, começamos juntos a traçar o nosso destino... na verdade, vários destinos.

O sonho parecia realizado, e ainda sem um fio de cabelo branco, e mesmo longe de ter uma Harley, nós começamos a rasgar inúmeras retas, que acabaram exigindo uma moto mais forte e a companhia de amigos.

A Shadow substituiu a Viraguinho no momento em que eu vesti um colete de Moto Clube, e naquele momento, cheguei a acreditar que havia conquistado tudo.

Eu tinha uma moto possante, as costas tatuadas, uma gata na garupa e fazia parte de uma “gangue de motoqueiros” – eu era fodão e estava na estrada!

E de tanto me pedirem dicas de destinos e cartões de hotéis, com apenas um ano de motociclismo criei um site para compartilhar as minhas experiências... e a expectativa de instruir, divulgar e incentivar a prática do moto turismo quase foi soterrada diante de críticas e deboches, afinal, quem era aquele garoto de fraldas, pretensiosamente dando dicas de viagens de moto?

Eu era tanto quanto sou hoje... um aprendiz!

Críticas... não tenho problemas nem com as construtivas e nem destrutivas! Mas não pude evitar a dor das palavras, quando passados quatro anos em pequenos trajetos, me lancei em uma viagem de longa distância, e consegui os primeiros patrocinadores por conta da repercussão do Diário de Motocicleta na época.

Fui chamado de vagabundo e oportunista, e antes mesmo de partir para terras estrangeiras, entreguei meu colete e segui com medo do que haveria depois da fronteira, já que as histórias de assaltos, estradas horríveis e “Loiras do Banheiro” assombravam aqueles que nunca tiveram o tesão de ir muito longe.

E a porteira do mundo se abriu para quem já achava essa Terra gigante baseado nas colinas de Minas Gerais.

Me emocionei motocando ao lado do Lago Titicaca, subindo Machupicchu, cruzando o Deserto do Atacama e tocando a Mão do Deserto.
Superei todos os limites na RUTA 3 rumo ao Ushuaia, chorei de saudade no Fim do Mundo e falei milhões de palavrões no rípio da Ruta 40.

Dei uma volta completa no Brasil, naveguei o Rio Amazonas e diante de incrédulos, rasguei a BR-319 com a Elda na garupa de uma V-Strom 650cc.
Foi lá que eu acampei pela primeira vez na vida, debaixo de uma antena da Embratel, pouco antes de uma onça cruzar o nosso caminho.

Subi Vulcões, cruzei o Atlântico, rodei um terço da Europa e bati recorde de distância percorrida no encontro Mundial da DUCATI na Itália.
Com as pernas tremendo engoli mais uma vez o choro diante de um dos homens mais inspiradores que já conheci... Sr. Giuseppe Visenzi, fundador da GIVI, uma empresa que sempre apostou no meu trabalho.

Sim... o hobby se tornou profissão no meio do caminho, e como faço o que amo, não trabalho um dia sequer da minha vida... de segunda a domingo, da hora que acordo até a hora de dormir tarde da noite.

Costumo ouvir que tenho muita coragem pra fazer o que faço, mas saibam que tudo na vida funciona de acordo com as nossas escolhas, e que nada tem a ver com coragem, que aliás, é o escudo dos tolos, por que ela nos dá o ímpeto de fazermos coisas sem ao menos medirmos as consequências.

O que eu tenho na verdade é medo de conhecer o mundo.
E é com esse medo que vou seguir viagem!


* 08/AGO/2006 à 08/AGO/2016 = 320.580 km mapeando 140 cidades ao redor do Brasil, por 23 Estados, 8 países da América do Sul, 4 na Europa.

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